cova triste


Publicado em
Texto por
Severo Garcia
Imagem por
Denise Severo

discurso do papa

Profiro sermões e transponho redenções aleatórias. Entretanto, sou, entre tantos, como uma casca de feijão desavisada no dente de um orador. A realidade é transitória e o tempo será testemunha. No temporal, por força do querer, a água pode afogar os sonhos e desviar os rumos, inclusive levar todos náufragos para onde nunca se imaginou. Entre tantos, diria que os outros buscam em mim uma orientação e até a salvação. Eu apenas gostaria de caminhar com minhas pernas no chão escaldante em um dia de verão. A velhice tem ensinado a reparar no atrito que há entre o povo e as contradições e sentir a textura da terra com os olhos do pé. Ainda que busque um carinho ancestral sob a pele forte do meu corpo e o sensível ao que nela toca, posso ser acusado de propagar uma peste. Ainda que a sensibilidade não toque todas as palavras daqueles que as procuram em mim, certamente carrego um governo secular e uma herança dos mortos. A história é uma adaptação de lugares sagrados e profanos, protegidos e expostos, rurais e urbanos, e pode ser enterrada em uma cova triste. A igreja é um estado. Fato. O valor de verdade, de um sermão, disputa com uma navalha o livre arbítrio.

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