Os pequenos gestos


Publicado em
Texto por
Severo Garcia

 

Éramos grandes. Não só em número, mas em tamanho. A numerosa família já estava distribuída por vários cantos. Tínhamos filhos altos. Curioso que os três primeiros pareciam não terem saídos de mim. Um metro e oitenta e cinco. Um metro e oitenta. Um metro e muito mais do que se esperava. Exceto a última filha. Um metro e cinquenta e nove. Somando eu e o Juarez não chegávamos a três metros. Ana, a última, precisou de atenção especial. Gestação de risco. Necessidade de cuidados. Pouco movimento. Passei muito tempo, neste período, deitada. Deslocamento da placenta eram o que diziam os doutores. Ana nasceu pequenina, na justa medida. Os irmãos altos eram ainda mais velhos do que se diz nas datas de nascimento. Ela parecia uma criança fora da curva. Vivíamos no interior. E nos conhecíamos o que os outros também diziam. Igreja, escola e comunhão. Ana crescia inspirado e cheia de vida. Inteligente, curiosa e perspicaz. Nós, às vezes, conversávamos sobre aquela menina linda e amorosa. Depois que os filhos crescem, o mundo acaba ampliando as escalas. Cada um em uma cidade, cada um achando seus desejos e nós, na torcida por suas conquistas. Ana também queria saber quem era, quem poderia ser. Quem sabe quem pode ser? Ela entrou na faculdade, foi morar noutra cidade. Nesta época, queria aprender a viver sozinha, sem arrumar confusão ou desconforto. Talvez a distância e a liberdade tenham sido um gatilho para perceber as suas descobertas. Ana descobriu, em si, Antônio. E Antônio é doce, sagaz, e sabe os perigos de ser quem se deseja ser. E neste processo estive junto com Antônio. A altura não mudou, assim como nosso amor. Embora, admito, às vezes, por razões desconhecidas recordo de Ana e sinto saudades de pequenas lembranças guardadas. Até choro sozinha quando percebo que sinto essa diferença, mas é tão gostoso saber que Antônio é meu filho.

 

Para Liane.

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